sexta-feira, 2 de outubro de 2009

Carta de um amor

chavena5“Vale:

As noites são muito longas sem a tua companhia, sem o teu corpo e sem esse teu aroma a flores silvestres de que tanto sinto saudades. Penso em ti. Vejo-te nua a correr para os meus braços, a colar-te à minha pele e impedindo-me de conciliar o sono que tanta falta me faz. Quando consigo, por fim mergulhar nas suas profundezas, ali apareces, outra vez, brincalhona. Metes-te debaixo das mantas, fazes-me cócegas nos pés, encarrapitas-te em cima de mim, acaracias-te até me enlouquereces e ofereces-me os teus belos seios… Bebo deles e tu desfaleces, para que eu te reanime. Era a tua brincadeira preferida, lembras-te? Esforço-me nos meus sonhos para sentir os aromas do teu desejo. Tu não te moves, mas consigo sentir a tua respiração suave e controlada. Sei que sentes prazer, que gostas, por isso volto a beijar o teu corpo suspenso pela excitação. Por vezes sofro, quando sinto que a vontade me quer vencer e tu ainda não estas pronta. Sei que tenho de atingir o ponto de arrepiar a tua pele com os meus beijos. Sei que é uma cerimónia lenta e inebriante, por vezes sofrida, mas sei que para te alcançar, para chegar ao teu limiar, assim tem de ser. Já nessas portas do paraíso te começas a mover. Que ritmos me ofereces! Por vezes confundo-os e por isso paro, para não me perder, para te acompanhar no compasso do teu bailado sensual, em que, por momentos, creio que sou apenas o teu par circunstancial. começas com uns sons suaves… E, quando me mordes as orelhas, mudas de rítmo (…). Continuas novamente lenta, um novo bailado (…). Vale, quando sinto que vou apanhar-te, quando já estou preparado para o último trecho, acordo e descubro que és apenas um sonho e, então, choro como uma criança. Porque já não escreves? Já não me amas? Já outro homem conhece os teus segredos na pista de dança? Será possivel que tenhas vislumbrado com outro amor o horizonte promissor na estreiteza da nossa cadeira de baloiço?

Soube que te libertaram. Aqui na Ilha as notícias são escassas. Conseguiste sair do buraco negro em que o nosso país se transformou? Onde estás? Voltarei a ver-te? Voltarei a amar-te na cadeira de bailoiço da tua avó?

Teu P.”

in, Tardes de chuva e chocolate,
de Amalia Decker Márquez

 

P.S: Também aconselho Domingo de Ramos de Clara Pinto Correia. São dois grandes livros sobre revoluções, que há sua maneira alteraram as histórias das pessoas e dos países, onde o enredo se desenvolve. Portugal e Bolívia, tão longe mas tão perto.

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